O papel que as empresas devem desempenhar está se transformando ao longo do tempo.
Porém essa transformação não encontra propósitos comuns. Como toda mudança, interpretações, reações, formas de execução e principalmente os objetivos empresariais
podem suscitar múltiplas formas de relacionamento com seus clientes, fornecedores, empregados e acionistas. Duas formas gerais de relacionamento das empresas com seus
públicos vêm sendo debatidas.
O debate sobre a relação de uma empresa com seus públicos exteriores é, em grande medida, para dizer o mínimo, dicotômico. Fundamentalmente, se divide entre duas correntes
antagônicas: a Teoria da Firma e a Teoria dos Stakeholders. A primeira originou-se no século XVIII, mas tem sua obra principal em Friedman (1962). Tal linha conceitual advoga que
gerentes devem tomar todas as decisões direcionando-as a aumentar o valor de longo prazo da companhia (Jensen, 2001). A segunda, Teoria dos Stakeholders é mais recente – Freeman (1984) é sua obra seminal – e considera que a empresa deve coordenar o interesse dos diversos públicos interessados.
Os defensores da Teoria da Firma indicam um papel circunscrito à maximização do valor para os acionistas. Os defensores da Teoria da Firma pressupõem tendência utilitarista, ao passo que distintas correntes teóricas contestam essa afirmação propondo outros fatores como motivadores do processo decisório.
A teoria dos Stakeholders vê as organizações como uma coleção de grupos cujos objetivos devem ser coordenados pelos gestores (Freeman, 1984). A definição clássica de Stakeholder é
“qualquer grupo ou indivíduo que afeta ou é afetado pelo alcance dos objetivos da organização”. Nesse sentido, “a compreensão mais abrangente e ambiciosa do conceito de
Stakeholder representa uma redefinição das organizações e de como devem ser conceituadas” (Friedman & Phillips, 2002, p. 1).
A teoria dos Stakeholders acirra divergências sobre valores profundamente arraigados, seus defensores e detratores tendem a não convergir. Percebe-se, também, que o aumento da
proeminência da teoria dos Stakeholders ocorreu porque é uma proposição que move as pessoas inclusive em razão da ressonância afetiva que seus pressupostos geram em muitos
indivíduos (Weick, 1999). A teoria dos Stakeholders, tanto quanto sua prática, portanto, parece dizer respeito às pessoas e seus modos de ver o mundo.
Diante de tais elementos, suscita-se a constatação de que empresas com características diversas devem possuir orientações igualmente distintas no que tange ao relacionamento com
seus públicos. As firmas podem desenvolver relacionamentos baseados em poder de barganha ou, opostamente, relações fundamentadas em reciprocidade e justiça. A relação entre
empresa e seus públicos é mediada pelo Poder e Legitimidade de tais Stakeholders e pela urgência de suas demandas. Esse modo de relacionamento da firma alicerçado na harmonia de relações de gestão para Stakeholders. Uma empresa com tal abordagem “aloca mais recursos para satisfazer as necessidades e demandas de suas partes interessadas do que o necessário para simplesmente manter sua participação” (Harrison et al., 2010, p. 58). Em essência uma melhor relação com Stakeholders provoca que esses compartilhem suas funções utilidades e, assim, retroalimentam o bom relacionamento aumentando o valor para a empresa a longo prazo.
Ainda que os dois papéis e objetivos das empresas devam ser respeitados, num crescente encontramos maiores demandas da sociedade, dos empregados, dos fornecedores e
principalmente dos clientes. Tais demandas podem ser identificadas pelas próprias organizações como podem emergir de exigências legais, oriundas dos representantes
legitimados pela população para tal fim.
Dentro desse contexto, como uma validação à tendência crescente das empresas em considerar os Stakeholders em seu processo decisório, foi promulgada a Lei 13.709/2018 – Lei
Geral de Proteção de Dados Pessoais. A LGPD está alinhada aos pressupostos da Teoria dos Stakeholders ao demandar maior proteção aos dados pessoais dos clientes, impondo
obrigações de cuidado, armazenamento, eliminação e portabilidade desses dados a todas as empresas que de alguma forma coletam dados de clientes para desenvolver sua atividade
econômica.
A Lei Geral de Proteção de Dados é um marco e um grande avanço nas relações entre empresas e clientes e tem por objetivo proteger os direitos fundamentais de liberdade e de
privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural, estabelecendo regras e limites para empresas a respeito da coleta, armazenamento, tratamento e
compartilhamento de dados, o que favorece o desenvolvimento econômico.
A Lei Geral de Proteção de Dados impactará as organizações. Todas as empresas serão afetadas e terão que se adequar a nova Lei. A condição básica é a de realizar algum tipo de
tratamento de dados pessoais, como por exemplo, desde um simples cadastro de clientes e processamento da folha de pagamentos até mais sofisticados para definição do perfil de
consumidores, sítios eletrônicos, big data, etc.
A Lei Geral de Proteção de Dados determina que todas as organizações indiquem um encarregado de tratamento de dados que será responsável pelas relações entre clientes,
empresa e a autoridade nacional.
Para se adequar a LGPD as empresas depois de identificar o seu nível de exposição, devem:
Mapear das atividades de tratamento de dados (clientes, fornecedores e funcionários), tanto a exposição passada como a definição dos tratamentos que serão necessários no futuro
(definição da finalidade do tratamento).
Revisar contratos para que exista tanto o consentimento do proprietário dos dados pessoais quanto à adequação dos fornecedores (que tratam algum tipo de dado pessoal para sua
empresa, como por exemplo, contabilidades externas), Implantar medidas para a segurança dos Dados Pessoais que podem ser segregadas em três tipos; a) ações relacionadas à proteção dos dados contra acessos indesejados internos e externos; b) ações de treinamento e orientação dos colaboradores e; c) controle de acesso à informação e segurança dos dados (exemplo: criptografia e anonimização dos dados).
Implantar regras Internas para a Governança Corporativa – que visem perpetuar a cultura dentro da empresa quanto à proteção de dados pessoais, inclusive um plano para
gerenciamento de crises.
Definir o DPO (encarregado de tratamento de dados), a rastreabilidade do tratamento de dados, a forma de atender as demandas dos titulares dos dados e a comunicação com a
Autoridade Nacional. Sumariamente, a LGPD visa atender a uma das mais recentes demandas da sociedade digital, a proteção de dados, alinhada aos pressupostos do maior engajamento dos stakeholders no papel a ser desempenhado pelas organizações. As organizações estão se adequando a nova sociedade, sendo impactadas e impactando as novas relações impostas pelos avanços tecnológicos. A pergunta final é: sua organização está focada exclusivamente na geração de lucros ou deve se preparar para responder as demandas de seus clientes? Nesse caso específico, indistintamente de suas crenças, a LGPD impõe a adequação de sua organização num prazo exíguo de tempo.